terça-feira, 23 de março de 2010

domingo, 14 de março de 2010

chamo a tua sombra na noite,
como um desejo escondido sob os lençóis.
o teu silêncio, espero-o para me acalmar as palavras
guardadas há tanto tempo no fundo de uma gaveta
para que tu, viajante sem rumo, as tomes
e com elas teças o caminho de mais uma
dessas viagens que sempre acabam na linha do horizonte .

posso nunca saber o teu nome.
posso querer-te mesmo sem te querer.
que essa paixão que o vento carrega,
que as marés trazem no medonho das ondas
não é mais que a saudade que se tranca
sob o tecto de quem te vê, de novo, partir.
que se arraste nas brumas que dormem sobre o mar
este amor que me consome e é tão só,
como só está a cama em que esqueces as tempestades.

nunca te perguntaste nas tuas viagens,
oh, estranho viajante, de quem eram as lágrimas
que o teu barco pisava quando eram outras
as rotas do teu destino?
nunca te perguntaste de quem eram os gritos
que pareciam surgir do fundo do mar
como se as marés aniquilassem um resto
de vida presente num corpo?


espero um anúncio de ti sob o mar.
aqui, na orla da praia,
enquanto as ondas se desdobram na saudade
sou a silhueta distorcida que tempo apagou.
um corpo, um raio de luz.

o teu farol.

sábado, 13 de março de 2010

i

Arrasto me nesta loucura incessante de ti, desse querer que hoje me consome e me mata. Esse adeus que não foi tocado, olhado, abraçado. Ardem me no c orpo todas as estações que passam sem ti. Doem como cicatrizes fundas de beijos de outrora. Abrem-se no corpo como frexas de uma memória de ti, criança da lua.
Ainda espero que voltes. Aguardo o sussuro debaixo do ouvido e o calor de um regresso que longe se avizinha. Não te guardo mágoas, não. Apenas o peso das escolhas que hoje aumentam a tua ausência.

Tenho saudades do mar. Do pôr do sol. Das horas que sumiam.
Hoje seria diferente.

segunda-feira, 8 de março de 2010

coisas antigas III




Existem gotas a delinearem-me o peito,
vapores que se afogam nos países dos dedos
e acendem a chama do teu nome,
enquanto me lavo em memórias do teu corpo
que se atreve sobre o meu.

Existe o som das gotas de água sobre
desejos perversos de te ter.
Possuir-te e abraçar gemidos sussurrados
que escapam dos teus lábios,
fazendo morrer o dia com
o primeiro beijo da noite.

O teu toque fechado sobre os meus seios,
A tua mão em utopias proibidas de mim.

Dorme comigo, hoje.
Afoga-te em mim.

[fotografia de Daniela Morgado]

domingo, 7 de março de 2010

Poetas




Aqui na orla da praia, mudo e contente do mar,
Sem nada jà que me atraia, nem nada que desejar,
Farei um sonho, terei meu dia, fecharei a vida,
E nunca terei agonia, pois dormirei de seguida.

A vida é como uma sombra que passa por sobre um rio
Ou como um passo na alfombra de um quarto que jaz vazio;
O amor é um sonho que chega para o pouco ser que se é;
A gloria concede e nega; não tem verdades a fé.

Por isso na orla morena da praia calada e sò,
Tenho a alma feita pequena, livre de màgoa e de dò;
Sonho sem quase jà ser, perco sem nunca ter tido,
E comecei a morrer muito antes de ter vivido.

Dêem-me, onde aqui jazo, sò uma brisa que passe,
Não quero nada do acaso, senão a brisa da face;
Dêem-me um vago amor de quanto nunca terei,
Não quero gozo nem dor, não quero vida nem lei.

Sò, no silêncio cercado pelo som brusco do mar,
Quero dormir sossegado, sem nada que desejar,
Quero dormir na distância de um ser que nunca foi seu,
Tocado do ar sem fragrância da brisa de qualquer céu.

Fernando Pessoa


[fotografia de Daniela Morgado]

terça-feira, 2 de março de 2010

dont go.


as memórias. são os únicos braços que nos confortam no vazio da presença. aquecem os lábios que soletram baixinho conversas de outrora. ouxa lá outros tempos tivessem havido.

[fotografia de Daniela Morgado]