segunda-feira, 20 de abril de 2009

sonhos de papel.


Lembro-me das janelas, como estavam embaciadas nesse dia. A chuva fazia-se sentir lá fora, acumulava-se em pequenas quedas nas folhas das árvores. Lá fora era névoa e vazio. E se todo aquele nada não mexesse comigo não teria visto aquele pequeno barco. Era um barco de papel coberto com as mensagens mais bonitas. Mudavam consoante o pensamento, atropelavam-se para justificar as críticas e entimidavam-se para sorrirem apenas aos carinhos. Via-o poucas vezes, que as viagens escreviam o seu nome nas margens, como um corpo de ninguém que vagueia para preencher as almas sozinhas. Esperava-o de braços apoiados na janela, e cada dia que passava sem as suas palavras era como um inverno gelado sem o calor de uma lareira. Pensava muita vezes nessa paixão pelo barco de papel, por esse universo de palavras que aparecia quando tudo parecia fugir... O papel preocupava-me. Era tão frágil, desfazia-se a cada despedida e deixava as palavras morrerem no lago, como os últimos suspiros de quem tinha mais para dizer. Ficam-se os sonhos nas margens para mais tarde se contarem a quem precisa de uma história para adormecer.
O barco nunca mais voltou e o rio que se tornou seu amante congelou para não deixar que outras palavras corressem no seu corpo.


[fotografia e texto por Daniela Morgado]

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